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Catarse

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Gostava mesmo que fôssemos dois atores numa peça de teatro. Em cima do palco, não precisaríamos de qualquer público, nós os dois seriamos suficientes para este espetáculo. Virados um para o outro, com o olhar um no outro, tal como deve ser o confronto entre duas personagens. Há uma altura em que os protagonistas da história se confrontam, não é? Um confronto de palavras, de gestos, de posturas, de silêncios. Um confronto de silêncios... Consegues imaginar como gostaria de representar isso contigo? Claro que não. Agora, imaginas lá tu que eu sequer existo ou que ainda penso em ti. Nós os dois, na penumbra do palco, tu perto de mim, eu perto de ti, apenas a olhar-nos em silêncio. Primeiro, hirtos, depois, ao de leve, moveríamos a cabeça, o meu olhar triste falaria muito mais do que o teu olhar surpreso poderia aguentar. No tempo que considerássemos suficiente, o silêncio terminaria. E eu perguntar-te-ia: não tens qualquer apreço por mim, pois não? Ali, no palco, com apenas os deuses da ...

Carta a Ti II

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Tenho pensado muito em ti. Ou, melhor, voltei a pensar muito em ti. É por isso que te escrevo. Tens estado comigo, nos meus pensamentos, mais do que é habitual. Espero que nada se tenha passado. Oh! Mas, o que poderia ter acontecido? Tu estás bem, na vida que escolheste, sem qualquer resquício do que fomos. Talvez se tivesses um qualquer grão de pó daquilo que nos aconteceu não estivesses tão bem. Como se nada se tivesse passado. É muito melhor assim. É assim que sempre foi, que sempre será. Não haverá uma qualquer surpresa de que voltes, de que me pegues na mão e me faças sentir-te como eu nunca senti. Eu sei que não... Escrevo isto como... É uma alternativa da minha imaginação àquilo que eu vivo. Àquilo que tu vives. Sabes, eu gosto muito de imaginar alternativas. Por vezes, enquanto construo uma outra vida com a minha imaginação é muito apaziguador. Com a minha imaginação eu consigo ver-me num outro local, a fazer outras coisas, com outras pessoas... contigo. Quando aparecias eu apa...

Foges de Quê?

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Foges de quê? Gostava tanto de poder perguntar-to. Assim. De forma simples e direta. A olhar-te nos olhos, sem desviar a cabeça, centrada em todos, em cada mínimo detalhe da tua face. Foges de quê? Foi algo que te fizeram? Ou foi algo que tu fizeste? Não te conseguiste perdoar? Arrependeste-te? Ou não? Tens vergonha de o admitir? O que é que dizes a ti próprio todos os dias? Ou não dizes nada? Não sei bem se faço estas perguntas por ter esperança de que as tuas respostas me dessem alguma tranquilidade. Sim, talvez essas respostas me dessem algum entendimento daquele momento. Daquele milionésimo de segundo. Daquela conversa pensada. Daquelas tuas palavras, cada uma delas ensaiada. Mas, além disso, apercebo-me de que gostava que me dissesses do que é que foges, porque eu quero saber. Genuinamente, eu quero satisfazer a minha curiosidade. Quero mesmo saber quais as razões que explicam essa tua bipolaridade de ação. Não é possível um só ser humano conter tanta contradição: sedutor, manipul...

Mataste-me

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Mataste-me com a tua bonita mão, Que pegou no meu coração  E levaste-o com um puxão. Enquanto com os teus dedos o apertavas, Ele na tua mão sangrava E com pena me olhavas. Afastaste-te e contigo o levaste. Hirta e vazia me deixaste, o que me trazia vida tu arrancaste. Fui cedendo. Primeiro uma perna, Depois outra. Acreditei que ainda virias, Que o meu coração restituirias. Manti-me de joelhos. À espera. O braço deu de si. Para que querias o meu coração? O outro braço também descaiu. Deixei-me cair no chão. Que faço eu agora sem o meu coração? Com o peito aberto, Com as vísceras a descoberto, Com uma dor sem comparação. Que faço eu agora com o vazio no meu peito? Com as veias decadentes, Não mais com fogo ardente, Sem amparar este despeito. Porque me mataste? Porque deixaram que ele me matasse? Deus… Como estou cansada. Roubaste-me o coração. Não tenho forças para o ir buscar. Jazo neste chão, Ainda à espera que me vás procurar. Desejo ver-te  Para que me digas onde o meu coraç...

A Riqueza da Ilusão

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Dizem que damos importância ao que temos quando o perdemos. É capaz de não estar longe da verdade. Ultimamente, tenho pensado muito na importância de andar iludida. A tomada de consciência do engano é que nos tira a ilusão. Ou não? Pensemos, a ilusão não significa que não saibamos a nossa verdade. Como diz o dicionário, a ilusão é uma "esperança irrealizável". É uma ideia que temos que não se vai concretizar. Ou seja, viver na ilusão não quer dizer que não se saiba o que é a nossa realidade. Sabe-se, mas conseguimos ter esta capacidade de imaginarmos algo de diferente, com uma esperança que sabemos que não se concretizará. Parece um paradoxo, mas creio que possa ser essa a melhor definição de ilusão. E isso é essencial quando não se quer viver a realidade, porque não há uma identificação ou nem sequer a queremos. É como se conseguíssemos viver com esperança no sonho que está na nossa cabeça. Isso é bom. Acreditem que é apaziguador. Viver-se iludido com alguma coisa é óptimo. ...

A Caminho de Casa

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Começo a andar rumo a casa e sinto o leve vento que me adorna a face e distrai, fazendo com que não desista do meu caminho. Subitamente, uma ideia vem-me à cabeça, não sei bem porquê. As pessoas estão cansadas. Noto isso todos os dias. As pessoas têm um ar cansado, farto, saturado. Pelo menos a maior parte das pessoas com quem cruzo deixam-me esta razão. Tal como eu, concerteza. Não sou diferente da maioria das pessoas. Também eu me sinto cansada e por mais tempo que tenha parece que o cansaço está no interior dos meus ossos. Eu vejo o cansaço na face das pessoas, nos seus olhos, nos seus cabelos. No vagar do seu andar. O meu pensamento é interrompido pelo barulho da porta de um carro a bater. Uma mulher sai lá de dentro, a cambalear, enquanto que o carro segue o seu caminho. As prostitutas deambulam por ali àquela hora de fim de tarde. Não sei se estão a regressar, como esta, ou se esperam alguém ou se é, para elas também, o fim de mais um dia. É frequente irem contra os respiradouros...

"Nobre Vagabundo"

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Encher o pulmão. Cantar. "Quanto tempo tenho pra matar essa saudade Meu bem o ciúme é pura vaidade Se tu foges o tempo Logo traz ansiedade Respirar o amor  Aspirando Liberdade" Lembro-me bem que ouvi aquela canção vezes sem conta na casa da vizinha. O disco tocava e tocava na aparelhagem e isso parecia-me excecional. As tardes era muitas vezes passadas com a música a ecoar pelo quarto e com o cd nas mãos. Era espetacular perceber que aquele pequeno objeto tinha tantas canções. E era bom, era alegre, cantava-se, e de que maneira!, e dançava-se. Como se dançava... Primeiro, eu ficava apenas a ver, mas eram raras as vezes em que não dançava. Eu adorava. Naquelas tardes, os sonhos voavam e dava-se larga aos pensamentos, à brincadeira, aos sorrisos... Havia muitos sorrisos, lembro-me bem disso. E isso era bom, era esperançoso. Quando se é pequeno vê-se as coisas a essa dimensão: tudo é bom, quando é bom. Não há meios bons, nem segundos pensamentos. A nossa inocência faz com que s...