A Imunidade do Egoísmo

Vivemos num mundo onde não nos conhecemos.
Por mais tempo que passemos com as pessoas elas continuam sem nos conhecer. Sem saber daquilo que gostamos, sem saber aquilo que odiamos, sem saber o que nos faz bem, sem saber o que nos faz mal. No nosso quotidiano temos muito a ideia de que os outros quando nos fazem alguma coisa que nos magoa, que o fazem de propósito. No entanto, cada vez mais creio que não é assim, à excepção, é claro, de quando falamos de vingança deliberada. É frequente dar-me conta de que as pessoas não estão "nem aí", como dizem os brasileiros, para as suas acções. Nem sequer estão a maquinar determinado movimento porque sabem que aquela pessoa vai ficar arrasada. Não. Nada disso. Elas não querem sequer saber o que é isso.

Vejamos.
Vivendo num mundo onde cada vez mais as pessoas são egoístas, aquilo que acontece, é que só olham para elas próprias. Se é assim, elas nem sequer conseguem levantar a cabeça para ver o que está à sua volta, ou melhor, quem está à sua volta. Por isso, como podem querer magoar alguém com intenção? 

Aquelas que são magoadas, são aquelas que ainda estão atentas àquilo que as rodeia. Pois uma acção provocada por outrem tem ainda o poder de as fazer sofrer. Para essas não existe a imunidade do egoísmo, muito pelo contrário. 

Muito daquilo a que assisto leva-me a presumir que, de facto, estas pessoas que têm consciência da presença do outro, neste mundo de egoístas, se sintam à margem de tudo. São, muitas delas, pessoas sem voz, sem presença, chutadas como uma pedra que está no caminho. E aí têm duas opções: ficar, à espera que as coisas aconteçam, ou podem insistir em seguir, em voltar a rebolar pela estrada até chegarem onde querem. 

Creio que nenhum destes dois caminhos seja fácil. Começando, pelo último de que falei, não vai ser pêra doce conseguir alcançar o que quer que seja. Na realidade, o egoísmo está por toda a parte, por isso passam quase uma vida a tentar combatê-lo. Nessas batalhas vão cair e voltar a erguer-se para que nos combates seguintes tenham hipóteses de ganhar. Sim, porque acredito que alguns chegam à vitória e conseguem triunfar neste mundo que não passa de lixo. Para mim isso explica porque é que ainda existem boas pessoas e que conseguem ter uma boa vida. São aqueles seres humanos únicos que são verdadeiramente felizes, da forma que mais desejam e que sonharam. 

No entanto, na minha opinião, penso que nem todos aqueles que escolhem o caminho de não desistir são bem sucedidos. Infelizmente, alguns vão ficar para trás e isso deve ser demasiado sofredor. São aqueles que por mais que tentem tudo nesta vida não conseguem realizar-se. Passam todos os dias a tentar, mas os obstáculos estão sempre lá, novos ou velhos. E crescem. Por vezes, a vontade destas pessoas também e nunca deixam de tentar. Tanto e de forma tão contínua que aquilo que acontece é não se dão conta de que nunca vão ultrapassar a barreira de cimento que se foi erguendo à sua volta e assim ficam: inconformados e sem nada de bom dentro de si. Talvez daqui possa surgir a inveja (mas isso fica para outro texto)...

Fazendo ainda uma pequena referência ao primeiro caminho que referi: ficar parado, à espera de que as coisas aconteçam. Por muito tempo pensei que, quem é assim, não podia pensar com todos os seus neurónios. Julguei-os muitas vezes. Porém, nunca pensei que aqueles que se deixam passar pela vida talvez tenham medo daquilo que pode correr mal e que, por isso, nada fazem. Quando se tomam decisões na vida, infelizmente ou felizmente (depende do ponto de vista), nós nunca sabemos o que daí advém. E eu sei que estas pessoas, depois de as conhecer e saber as muitas razões que as levam a agir dessa forma, têm uma vida dura e não sou ninguém para julgá-las. Elas vêem a vida a passar por si, não têm verdadeira voz, estão sozinhas.

Completamente, sozinhas. 
Se não conseguem dar o passo em frente, como podem ter o à vontade com alguém e serem completamente verdadeiros, mostrarem aquilo que são, as suas qualidade e defeitos? A mim parecem-me duas coisas muito difíceis de conjugar. É sofredor ver tudo a passar por nós, querer gritar e não ter voz. E, apenas, chorar em silêncio, a desejar que tudo passe. É duro. Muito duro.

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