O Vínculo da Transparência
É quase como um jogo de pingue-pongue.
De um lado, uma pergunta. Do outro, uma resposta. E, assim, vice-versa.
Por vezes, o silêncio também se instala. E quando assim é, nada parece estranho ou pouco confortável. Não. Muito pelo contrário. Ela sabe que ele a olha, ela sabe que ele está atento ao que ela está a fazer. Por isso, basta uma pequena palavra, uma constatação de um facto, para que ele a oiça. E ele responde, diz algo sobre aquele assunto. E a conversa continua animada.
Mas, são os olhares, as expressões faciais, o acenar da cabeça, a forma como o seu corpo se coaduna com o lugar onde está. A sua postura corporal, descontraída e completamente à vontade. Sim. Continuam a ser os pequenos gestos que ficam na memória, que mais a fascinam.
Ela tenta chegar a um papel, ao mesmo tempo que ele. E, subitamente, as mãos tocam-se. E não há nada de desconfortável, nem de vergonha. Não. Há apenas uma leveza de espírito que se instala entre os dois... Uma leveza que parece querer elevá-los para um outro lugar... Ela sorri, mas deixa que a naturalidade daquele gesto fique entre os dois. De soslaio ela olha para ele e apenas vê tranquilidade. Por segundos, ela saboreia aquele toque entre os dois e não podia ficar mais serena.
São raras as vezes que ela consegue falar com pessoas assim... Verdadeiras e de coração aberto. Na maior parte das ocasiões ela sabe que não pode acreditar em toda a gente. Não pode levar tudo à letra. Não pode dar-se, ou melhor, nem sequer quer dar-se.
Porém, com ele é diferente. Sente aquele entusiasmo que todos sentimos quando estamos a conhecer alguém. Sente aquela vontade de descobrir, de ouvir, de partilhar. Não tem vontade de se esconder, nem sequer de arranjar subterfúgios para que ninguém veja o que é que ela é verdadeiramente. Não. Com ele, ela sente completamente o oposto. Tem até vontade de se dar a conhecer, de falar de si, o que é completamente descabido com quem quer que seja. Por alguma razão que ela desconhece, ali, ela sente-se segura. Segura e com alguém que tem algum tipo de interesse nela... Não um interesse sórdido, como tantas vezes acontece. Não... Ele tem algum interesse que o faz falar, que o leva a partilhar com ela algumas histórias, algumas memórias, algumas preocupações, algumas novidades.
Depois, chega a altura em que o vínculo estabelecido entre os dois é tão transparente que ele se sente à vontade de partilhar algo mais. É uma espécie de confissão, de transmissão de segredo que, por um lado a deixa de boca aberta, mas, por outro, a deixa com o coração cheio. Ser eleita por alguém, ainda pra mais alguém como ele, como a pessoa certa para partilhar tal história é... É um elogio, é um orgulho. É, no fundo, tão importante para ela perceber que causou tal impressão no outro que o faz partilhar algo deste tamanho. Ela foi importante naquele momento. Ao mesmo tempo que lhe fala, sempre tão próximo, mesmo ao seu lado, as suas caras tão próximas uma da outra. É ali, naquele momento em que ela se sente a pessoa mais importante do mundo. E que bom que é. Nem que seja por apenas um momento, ali, naquela rua, naquela casa, naquele quarto.
O tempo passa, e ela sabe que o oásis está a terminar. Está a chegar a hora de ir embora e, automaticamente, ela prepara-se para isso. E ele despede-se da melhor forma: com um sorriso aberto e meigo que a faz querer ficar ali para sempre. Ela coloca a mão no ombro dele, e ele inclina-se para ela. Partilham dois beijos na face e ela sabe que serão os últimos, assim, naquele lugar, onde estão só eles os dois.
Olham um para o outro. Dizem até já como quaisquer duas pessoas fariam: com a promessa de que voltarão a encontrar-se. No entanto, ambos sabem que uma partilha como aquela, que estão agora a terminar, não mais voltará a acontecer.
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