Cuidado... Leram-me a Sina!

Num jardim, a meio de um trabalho oiço alguém chamar-me. É certo que não foi o meu nome que soou por ali, mas quando ouvi "você, você", não consegui deixar de olhar. E, a verdade, é que parecia mesmo ser para mim. O senhor que me chamava tinha já uma certa idade e estava rodeado de mulheres, que olhavam para ele com muita atenção. Apesar de não ser muito destas coisas, acedi a falar com ele. Inesperadamente apenas me diz:
- Deixe-me ver a sua mão. Eu leio a sina!

Esta era a última coisa que julgava ouvir naquele momento. Fiquei meia surpresa. Não acredito muito nestas coisas, porém, com a minha boa disposição, aceitei o seu pedido e disse-lhe para "ler a minha mão". 

Muitas coisas disse de forma meio atabalhoada e algumas vezes repetitiva. No entanto, a primeira frase que saiu da sua boca, eu não me consigo esquecer. Podia falar sobre quantos anos de vida vou ter, se vou passar muitas dificuldades ou se vou ganhar o Euromilhões. Mas não. De forma bastante convicta, ele disse-me algo bastante importante:
- Você tem capacidade para tirar um curso superior!

Achei esta frase deliciosa. Tão deliciosa que a minha resposta não demorou muito:
- A sério? É que eu já tirei um!

E, obviamente, que me comecei a rir. Se eu andasse a dizer às pessoas que conseguia ler a sina, a primeira coisa que eu veria na mão de quem quer que fosse era se essa pessoa tinha ou não capacidade para tirar um curso superior...  Enfim... Mas, a verdade, é que achei uma grande piada ao homem. E ele prosseguiu com as suas "revelações":
- Você tem um complexo que não a deixa a avançar. Tem esse complexo sem razão nenhuma. Tem de deixar isso para trás!

Pois bem. É verdade. Eu tenho um complexo, aliás, tenho vários, como a maior parte das pessoas. Achei que, talvez, ele agora conseguisse fazer sentido.  
- Ah! Mas estou a ver aqui na sua mão que a linha do dinheiro tem duas interrupções: uma aos trinta e cinco e outra aos quarenta anos!

Eu, num estado de quase "ansiedade", quis perceber o que ia acontecer aos 35 e 45 anos para que tivesse "interrupções na linha financeira"... Ainda por cima logo nessas idades... É que, teoricamente, uma pessoa compra casa, tenta melhorar a sua vida e pensa mais seriamente no futuro. Decide adquirir outros bens, ter filhos ou até viajar, já que a vida profissional pode estar estável (ao pensar assim, por breves segundos, esqueci-me que estou em Portugal). No entanto, depois de questionar o senhor, para perceber o que queria dizer com isto, ele desconversou. 

Logo de seguida ainda fiquei a saber que, mesmo sem ter dado conta, tive problemas de saúde nos primeiros dez anos da minha vida. Pena que nunca tenha ido parar ao hospital...

Segundo esta "leitura" vou morrer velha e a menopausa vai chegar tarde. Mas também não disse se ia ter filhos. Pelo menos, vou ter dois amores, ou melhor, como ele diz, "duas ligações muito fortes". Ao que parece até vou casar com um desses homens. Gostei muito da bondade deste "Sr. Leitor", mas bem se vê que ele não me conhece. Casar? Para quê? Para além disso, ninguém tem paciência para ninguém... E esses amores são raros, por isso, a probabilidade de algum deles vir ter comigo é quase nula. Essas histórias deixo-as para os grandes escritores...

Não vou esconder que até gostei de ouvir que sou uma boa pessoa, determinada e muito sincera. Nas palavras deste homem "às vezes, sincera de mais", o que acaba por me prejudicar. Ora, até penso que tem razão. Mas era capaz de dar mais valor a estas palavras se ele não tivesse visto na minha cara, várias vezes, que não acreditava em nada do que ele me estava a dizer. Pelos meus comentários e expressões, só podia estar a ser sincera...

A minha maior qualidade é a minha percepção. Consigo perceber quem são as boas pessoas e apenas me relaciono com elas. Às más, fecho a porta e ignoro. Pois bem, isso até é bastante verdade. No entanto, esta minha percepção nem sempre funcionou e já me deixou muito mal.. Talvez precise de ser afinada. Alguém sabe onde posso fazer a "manutenção" desta minha qualidade?

No entanto, houve uma coisa na qual este "senhor bidente" (desculpem! Queria dizer, vidente) acertou: não tenho muito êxito na minha profissão, porque não me relaciono com as pessoas do meio. É verdade. Não faz parte do meu feitio ser "prestável" para quem me pode vir a ser útil (o senhor é cuidadoso, porque isto corrobora uma das "minhas qualidades": a sinceridade). 

Não sou demasiado simpática para homens da política, nem tento mostrar como sou "espectacular" nas reportagens, nem "meto conversa" com outros jornalistas, principalmente, aqueles que trabalham para grandes órgãos de comunicação social. Desde há muito tempo que tenho essa consciência e que afirmo com toda a certeza: Eu Nunca Vou Vingar No Jornalismo! Não sei fazer "panelinhas", nem sei favorecer quem quer que seja. Não tenho nenhuma cunha, nem vou beber café com assessores e assistentes. Pois é: nunca vou sair do buraco. Quanto à "adivinhação" deste senhor, esta não é, na realidade, uma grande novidade: todos sabem que só se tem grande sucesso no jornalismo, se conhecermos as pessoas certas. Esse nunca vai ser o meu caso. Mesmo assim, desde que a minha frontalidade e o descanso da minha consciência me acompanhem isso é o mais importante.

No final de toda esta conversa e de muitas gargalhadas, que não consegui evitar, o senhor lá disse que gosta de dizer várias coisas sobre as pessoas, pode ser que acabe por acertar em algumas. E assim aprendi que podemos adivinhar o futuro: a dizer o que nos vem à cabeça. Não quer dizer que seja verdade, mas desde que os outros acreditem...

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