Mão Restauradora

Tenho feito algumas coisas diferentes, as quais me têm ocupado a cabeça, mas tu permaneces, sempre, como se estivesses atrás de um cenário no teatro, em que o teatro é o meu pensamento. Estás por lá, meio escondido, mas vejo-te sempre a sombra e sinto os teus passos.

Gostava de poder dizer-te tanta coisa. Penso que agora gostaria de te contar algumas coisas e de partilhar contigo o meu mais profundo sentir, tão confuso, sobre o que tenho visto. Gostava mesmo de te mostrar os meus pensamentos, sabes? Imaginar a tua expressão enquanto te conto as minhas contradições, faz-me sorrir... Tenho a certeza de que também tu ficarias confuso a tentar perceber onde estou e de onde venho. Sei, no fundo, que no final me mostrarias o teu bonito sorriso aberto e dir-me-ias: "não vale a pena estares a consumir-te com isso". Bem, na realidade, talvez não fosse necessário, concerteza conseguiria ser muito mais tranquila.

Estive em alguns lugares diferentes e gostava de partilhar contigo essa experiência. Muito embora sentisse que estavas perto. Às vezes isso é doloroso, noutras é reconfortante. Mas, no fim de contas, é a tristeza que prevalece. Gostava muito de voltar a ouvir a tua voz... A tua voz que é um embalo, que se transformava numa canção, quando falavas junto ao meu ouvido. Adoraria ter o teu olhar encantado com aquilo que te contaria, com o meu relato daquilo que mais gostei e do que considerei mais belo. Talvez, a nossa conversa fosse pela noite dentro enquanto te dizia o tinha feito naquele dia. Ou... Ou, então, nada disto seria necessário porque tu tinhas estado comigo e tinhas vivido as mesmas experiências que eu.

Mesmo não te tendo ao meu lado para to dizer, aqui to deixo. Sabes o que considero de mais belo? Ver como se restaura uma pintura antiga. É fascinante perceber a precisão, dedicação e astúcia, aplicada a cada pormenor e a cada traço da obra. Como se daquilo que está danificado se pudesse fazer o novo. Como se da placidez, viesse a luz. Como se do esbatido nascesse a definição. Ali vi que é possível dar uma nova vida a quem se julga morto. Deus, como eu gostaria de restituir a cor a quem de direito. Como gostava eu de ser a dona da paleta, dos pincéis e de todas as ferramentas para poder recuperar aquilo que se julga perdido.

Li, num outro dia, alguém que falava disso, sabes? Dizia qualquer coisa do género que quem está morto procura sempre dar vida aos outros para que eles não experimentem a morte. Talvez seja por isso que queira restaurar o que se julga gasto e sem cor.

Para além de tudo isto, gostava de falar contigo para saber como estás. Como estás tu nessa vida sossegada e rodeado de amor? Para ser sincera, para saber disto bastava-me ver-te, não precisávamos de conversar. Bastaria admirar-te a viver a tua vida, creio que além da imensa emoção, sentiria uma tranquilidade enorme por poder ver-te. Aqui, teria a mesma harmonia que tenho quando vejo uma esplêndida obra de arte numa exposição. No meu canto, pequenina, mas com um coração cheio por ver a tua bonita história. E, isso, seria maravilhoso.

Pintura de Jacopo Zucchi

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