Fatalidade
Vim dizer que te amo.
Sim, admito. Eu amo-te. Demorei todo este tempo para aceitá-lo porque me pareceu tão impossível, sabes? Como é que te poderia amar? A ti, que me roubaste a vida e a levaste contigo, mesmo sem o saberes?
É precisamente por me teres despojado do pouco que eu tinha em mim que eu sei... Agora, eu sei, que te amo.
Não lerás estas linhas. Deus... Por onde andarás nessa tua vida da qual já não faço parte, ou melhor, da qual eu nunca fiz parte? Seguro do teu futuro, cheio de responsabilidades, mas a sorrir, não é? Imagino-te sempre a sorrir. Mesmo que as últimas palavras que tenhamos trocado tenham sido tão dolorosas, assim que fecho os olhos e te vejo estás sempre a sorrir. E é bom, é apaziguador. Aquele primeiro segundo na minha imaginação apazigua tudo.
Tal como quando nos encontrámos. Foi tudo um bonito sonho, creio que até já o escrevi aqui. Estou a repetir-me. Mas, esse meu sonho foi tão bonito e tão estonteante que eu agarrei-me a ele com unhas e dentes, com a crença absoluta de que quando abrisse os olhos esse encontro não mais seria um sonho, mas, sim, a realidade. Quis mesmo acreditar nisso. E, por algum tempo, acreditei mesmo, sabes? E estava tão viva, tão cheia de esperança e com a ilusão de que, finalmente, estava a viver. Concerteza que não imaginas o que é isso. Não sabes o que é estar morto em vida (e ainda bem). Foi como se finalmente eu tivesse nascido com a esperança nos olhos e o calor que faz bater o coração.
Admito-te que te amo, agora que eu sei que nunca o saberás. Afinal, isso é já irrelevante, já não te lembrares, sequer, do meu nome. Porém, ao admitir-te que te amo nestas linhas, que nunca lerás, admito-o também a mim própria. É mais fácil assim, por isso te enderço estas palavras.
Dizia eu que agora posso dizer que te amo, porque tenho a certeza. O que poderá ser este sentimento que me mentém constantemente contigo, quando já não estás presente? O que poderá ser este sentimento que não se iguala a nada, a nada, por mais que eu tente seguir e preencher o meu tempo? Percebes? Não há nada igual a isto. Não há nada que o substitua! Não há nada que me faça esquecer aquela intensidade.
Os anos passam e eu continuo a chorar por ti, a rezar por ti, a pensar em ti.
Sabes, também sei que te amo porque cada vez que penso em ti, a primeira coisa que eu sinto, mesmo que seja fugaz, é que estás bem. Estás e estarás bem. Não penso apenas no presente, mas também no futuro. Num qualquer sentido esotérico, ao qual não sei dar o nome, talvez também seja o amor, aquilo que eu sei é que estás bem. Chega a ser reconfortante, se no momento seguinte não chorasse por não conseguir ultrapassar-te.
Ultrapassar o que sinto.
Os anos passam e não consigo deixar de sentir-te. Se assim é, só poderá ser amor, não? Não consigo deixar de sentir-te e mesmo que isso possa ser bom, não deixa de ser doloroso.
E... Deus, como estou cansada dessa dor, sabes? É que estou mesmo cansada...Um cansaço que sinto em cada parte do meu corpo. Tal como este meu amor por ti, que está em toda a parte. Dentro e fora de mim. Está por todo o lado e estou tão cansada de estar sempre a fugir dele, sabes? De dizer que não, isto não pode ser amor. Estou cansada de me esquivar desse amor, do medo que esse amor me provoca.
Mas... De que raio estou a ter medo? Este amor nasceu em mim e há-de morrer comigo, afinal nunca me deste a oportunidade de o viver contigo. Foste tão perspicaz.
Gostava de não sentir toda esta fatalidade. Afinal, este amor é uma fatalidade, morto no meu coração.
Se assim não fosse, eu ainda teria alguma esperança e a vida teria algum encanto. É mesmo muito melhor viver-se assim. Antes deste amor nascer em mim eu não gostava muito da minha vida. Já tinha uma esperança muito pequenininha, mas ela estava lá e ajudava-me todos os dias. Agora, não está lá qualquer réstia de esperança ou de encanto, ficou apenas este sentimento maior do que eu, assim mesmo grande, que me derruba e consome e com o qual não sei lidar.
Mesmo depois destes anos. Destes fatídicos anos, que me fazem estar parada no mesmo lugar à espera de que... À espera de que a vida se cumpra sem qualquer surpresa. Sem a verdadeira vida.
Amo-te. Na tua maior qualidade, no teu maior defeito, pelo teu presente, pelo teu passado, pelo teu futuro. Amo-te nesta esperança desperançada, para sempre devastada.
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