O Último Encontro
É na troca de um olhar, num simples gesto, aquele tom de voz distinto. É nessas pequenas coisas que ela repara. Hoje, ele está diferente daquilo que ela se lembra. Talvez, ele esteja cansado... Agora que pensa nisso, ela acha que nunca o viu cansado, o que justifica a sua surpresa.
"Está tudo bem?", ela pergunta.
Ele esfrega os olhos, para depois olhar directamente para ela. Assim, profundamente, como se daquela forma lhe visse a alma. Ela quase que se perde a olhar para aqueles olhos castanhos, com um laivo de verde. Porém, ainda vai a tempo de prestar atenção ao que ele diz.
"Hoje estou cansado...".
Ela sorri levemente. Não se enganou... Senta-se e falam.
Um pouco de tudo e de nada. E ela sabe que esta será a última vez que estarão juntos. Em breve, tudo terminará. Talvez seja por isso que parte de si esteja já triste, impedindo-a de aproveitar o momento na sua plenitude.
Mesmo com esse sentimento que começa a toldar o seu pensamento, ela vai notando novas características que a fascinam... E deixa-se estar... A aproveitar as risadas, as piadas, as palavras descontraídas, mas também as sérias... A forma como ele se acomoda, como se inclina, como se encosta.
E, aí, ela pensa... E se as coisas fossem diferentes? Se ela fosse uma outra pessoa, com outra mentalidade, com uma diferente forma de estar... No fundo, como seria se ela soubesse impressionar? Ela sente que se está a perder no pensamento e não a focar a sua atenção nele... Mais tarde ela poderá fazer essas perguntas a si própria. Agora não é o momento. Por agora, ela apenas quer ouvi-lo, para poder marcar tudo na sua memória. É mesmo bom sentir-se assim... Tão diferente do que está habituada. Mas, depois, ela pensa que se calhar está a atrasá-lo para alguma coisa. E a última coisa que ela quer é ser um empecilho.
E aí é chegado o momento de se levantarem e também nisso estão em sintonia, não precisando de estar à espera um do outro.
E ela sabe, como ela sabe, que está a caminhar para a despedida. A despedida traz duas emoções diferentes... Primeiro, a ânsia de pode estar mais perto, segundo a tristeza de virar costas. Ela sabe que apenas se sente assim por saber que nada tem de útil. Em tudo. É por isso que quando tem a atenção de alguém, ela fervilha, é como se tivesse ganho o dia, ela sente que tem a motivação suficiente para voltar a sorrir, volta a sentir aquela impressão no estômago, uma espécie de nervoso miudinho, mas que sabe tão bem... É de tudo isto que ela vai sentir mais saudades. É dessas sensações de que ela vai sentir falta... quando o deixar de ver.
De frente para ele, ela sorri. Deus queira que ele seja feliz. Verdadeiramente, feliz.
Os dois trocam um beijo na cara. Ela suspira silenciosamente. Depois, volta a olhar para ele e acena.
"Adeus"
"Adeus"
E, finalmente, ela vira costas e inicia o seu caminho de regresso para a sua vida rotineira. Mas, ela sorri. Como foi bom todo este tempo... .
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Já é de noite. Ela está deitada na cama e aconchega-se na sua almofada. E fecha os olhos. Ela vê-o, o que a deixa com um leve sorriso. Mas logo, a memória fá-la dar-se conta do vazio enorme que agora existe e que vai existir daqui para frente. Um caminho sem ânsia, sem burburinho, sem expectativas. Tudo regressou ao normal. Agora só lhe falta voltar a viver como vivia antes de todo o rebuliço de sentimentos que ele lhe trouxe. Agora só lhe falta regressar, em definitivo, àquele que sempre foi o seu caminho.
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