O Pesadelo do Mundo Robô
Tudo está escuro.
Saio para a rua e tudo está negro. Ninguém se aproxima. Ninguém fala. Ninguém olha. Ninguém sente.
Continuo em frente porque não sei para onde ir. Só sei que não quero recuar. Tenho medo de olhar para trás. Tenho medo de dar um passo atrás. Tenho medo de me virar para trás.
O que é que aconteceu às pessoas?
Estas são como robôs. Corpos inanimados, mecanizados, programados para fazerem tudo o que os outros fazem.
Olho para o lado na esperança de poder saber o que se passa... Mas agora já não vejo ninguém. Tudo está numa imensa escuridão... Onde raio estão as luzes? Aqueles candeeiros altos que estavam mesmo aqui, na rua, ontem à noite? Eu tenho a certeza de que passei por eles ontem à noite. Incrivelmente, parece que alguém os tirou daqui. Que porra! Não consigo ver nada e estar aqui começa a fazer-me impressão. Não conheço ninguém... Nem sequer um rosto familiar encontro naqueles que por mim passam. Agora reparo que muitos são velhos... As profundas rugas parece que chegam aos próprios olhos, os quais todos parecem ser de vidro: sem cor nem expressão.
Sinto o meu coração a acelerar e começo a correr. Quero fugir daqui. Quero sair daqui o mais rápido possível para poder encontrar algo que me diga que não estou louca... Que estou no mundo onde nasci e cresci.
Chego, finalmente, ao fim da rua e quero, desesperadamente, virar à esquerda mas não consigo. Não consigo porque, não sei de onde, apareceu uma multidão. Uma multidão que agora me obriga a virar à direita. Mas eu não quero! Eles agarram-me... Sinto aquelas mãos rugosas e pegajosas em cima dos meus braços e das minhas pernas. Todos eles estão a puxar-me para a mesma direcção. E eu grito! Eu juro que grito, mas ninguém me ouve. Grito até ficar sem voz, mas de nada adianta. Essas mãos despem-me e, de repente, estou vestida com o mesmo que eles. Aqueles fatos cinzentos que nos fazem parecer todos iguais. Não! Eu não quero isto! Tento despir-me, mas já não sou capaz. Aquela roupa pegou-se a mim. Agora faz parte de mim. Faz parte da minha pele. E eu choro. Eu choro, porém, outra vez, uma daquelas mãos rugosas seca-me as lágrimas e paro de chorar. A mesma mão passa sobre os meus lábios e um sorriso aparece na minha face. Nada é natural e sincero.
Não.
Mas ele está lá. Parece que foi colado com super cola três e agora já não sai. Tento mexer a minha face, mas ela não corresponde à minha vontade. Merda! Eu nem sou capaz de mexer a minha cara. Nem sou capaz de mexer as minhas sobrancelhas.
Olho para o lado e, afinal de contas, todos eles estão como eu...
Ou serei eu que estarei como eles?
Honestamente, já não sei. Já não sei nada. Eu só quero voltar a ser eu, mas eles obrigam-me a ir com eles. A segui-los.
Sei que já não estou na minha rua. Estou num local diferente, onde nada conheço. E tenho medo de me perder. Estas figuras parecem saber para onde vão. Será melhor segui-los? Eu não quero estar sozinha... E assim vou. Atrás deles...
Agora dou-me conta de que até o meu andar já não é o meu andar. É, antes, o andar deles. É igual ao andar deles. Desaprendi o meu andar... Bem, é melhor segui-los...
E assim vou. Com a mesma expressão, sem saber o que estou a fazer...
Apenas que estou a fazer.
A fazer o mesmo que os todos os outros, sem nada sentir.
Acordo.
O meu coração está a bater fortemente. Coloco a minha mão sobre a minha testa, que está encharcada no meu suor. Até o meu cabelo está molhando. Tento respirar mais devagar. Fecho e abro os olhos duas ou três vezes para ter a certeza de que estou no meu quarto. Sento-me na cama e puxo o lençol para cima. Estou, de facto, no meu quarto. Não sei o que me assustou mais: o mundo obscuro onde estava ou ser igual aos outros. Ser um robô como os outros. Pensar como os outros. Agir como os outros. Fazer o que os outros faziam. Sem identidade. Sem pensamento. Sem vontade própria. Sem sentir.
Fecho os olhos.
"Tem calma, foi só um sonho", penso.
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