Tempos de Ouro para o Jornalismo Português

Vivem-se tempos de ouro para o jornalismo português. São só assuntos a aparecerem para satisfazer a sede por notícias, reportagens, especiais de informação, suplementos, entrevistas e mais umas quantas coisas. E, ainda por cima, são assuntos de diferentes áreas e para todos os gostos: é na saúde, é na justiça, é na política, é na parolice... Em tudo e mais alguma coisa. 

Ora então vejamos:
- O surto de legionella veio "invadir" as televisões e alimentar o histerismo que estava tão calmo e acanhado nas redacções. São milhões de jornalistas a rodearem o Director Geral da Saúde, o Ministro da Saúde, o Presidente da Câmara de Vila Franca de Xira... Os directos junto aos familiares de alguns doentes que estão internados. É o horror. Ninguém sabe o que fazer. Até confundem concelhos com conselhos. Já estão sem saber como perguntar o mesmo, mas de forma diferente, só para não maçar... É o inferno do imediato. Cada vez que ligo a televisão sinto que me vão afundar com tanta chinfrineira. Amigos. Tenham calma. Eu sei que cada vez mais o jornalismo é imediato, mas escusava de ser histérico e vazio de valor e significado. É cansativo.

- Os magistrados que foram expulsos de Timor. Será que me podem fornecer informações correctas e relevantes sobre este assunto, assim de forma simples e clara? Como se cumprissem aquilo que é um
dos princípios básicos do jornalismo, digo eu... Por exemplo, estão a relacionar esta expulsão com casos que estavam na justiça e que envolvem empresas petrolíferas, mas também outros que envolvem governantes timorenses. Sim. Podem ser razões, mas, por favor, não se ponham com probabilidades. Investiguem, comprovem e, pelo amor de Deus, arranjem testemunhos de quem realmente interessa. Foi deveras engraçado levar um destes juízes para ser entrevistado na televisão e dos minutos que falou aquilo que disse com relevância para o caso foi, simplesmente, que não sabia porque tinha vindo embora. E, claramente, não podia dizer se algum dos casos das petrolíferas tinham que ver com a expulsão dos magistrados. Não sabia. Não era da competência dele. Não seria muito melhor se realmente pusessem um magistrado a falar, um daqueles, que tenha tido dedo na matéria? Seria tão mais interessante, tão mais factual e tão mais bombástico. Porque não trabalham?

- A criança prematura que está no hospital do Dubai... Ressalvo de imediato que entendo que esta é uma situação grave, que envolve a vida de uma criança cujos pais estão sem saber como agir.  Não vou aqui dar a minha opinião acerca desta situação em concreto, mas alguém me explica porque raio a comunicação social está a ser tão evasiva na vida desta família? Enviar jornalistas para o Dubai? Realizar reportagens diárias sobre esta situação? Estar em casa desta família? Falar consecutivamente com os pais? Mas o que é isto? É certo que, em parte, os pais deram-se a conhecer, como forma de arranjar ajuda, mas não será isto um exagero? Será que os jornalistas esqueceram-se daquela "linha que separa" a notícia concreta da notícia lamechas e sensacionalista, para terem mais uns minutos de audiência? Ou será que mantêm esta postura perante este tipo de acontecimentos de forma inconsciente? Sem pensarem na figura patética que realmente estão a fazer? Não sei qual das duas pode justificar este tipo de cobertura jornalística. Talvez sejam as duas. E tudo é, simplesmente, assustador. Se continuarem a pensar que isto é informação e que é disto "que o povo gosta", então, continuaremos a caminhar para uma sociedade cada vez mais vazia e inconsciente.

- Por último, não podia deixar de falar do Padre de Canelas. Tudo isto é um caso de parolice. É uma parolice o facto de a população de Canelas querer malhar no novo pároco, neste fim de semana que passou. É uma parolice a RTP acompanhar o caso há mais de uma semana. É uma parolice realizarem-se directos depois da missa (talvez porque esperavam gravar ao vivo e a cores o padre a levar uma sova, não sei). E, é também uma verdadeira parolice, as vozes que se importam em falar deste assunto daquela forma leviana, mais do que expectável, e que já não se deveria "usar". São aquelas vozes que agora apontam o dedo e dizem: "então agora estes querem bater no padre? São uma cambada de hipócritas. Aprendem que devem amar o próximo e agora querem escorraçar o padre. Estes são os piores!". Aos mais velhos ainda dou um desconto, agora aos jovens adultos que ainda aproveitam este tipo de coisa para apontarem o dedo a quem tem as suas crenças de forma tão "fraquinha" e óbvia é que eu não consigo entender. Faz-me uma certa confusão como é que esta cultura ainda não mudou. Pensava que as pessoas não tinham palas nos olhos, mas a verdade é que têm. Reforço aqui, que ao fazer todo este discurso, também não deixo de ser um bocado parola, porque, na prática estou a escrever sobre coisas que me ficaram na cabeça e que não deviam ter ficado pela sua mesquinhez. 

Nestes casos, em particular neste último, há diferentes tipos de parolice: a parolice tanto do lado daqueles que querem bater no padre, como do lado daqueles jovenzinhos liberais que não conseguem entender que existem pessoas que têm outro tipo de crenças. Da mesma forma que os outros aceitam que há quem não siga alguma religião, se calhar era giro começarem a aceitar aqueles que seguem. E tudo isto não deixa de ser uma questão estúpida, porque em termos de crenças, ninguém tem de aceitar ou deixar de aceitar. Somos livres. E ponto. E só mais uma coisa: é uma parolice tão grande, mas tão grande, pensar que este é um assunto que deve ser acompanhado nas redacções...

Vai bem o jornalismo. Cada vez melhor o espectáculo das notícias. Ainda não sei bem se me hei-de rir ou de chorar. Vou continuar a assistir a isto e já decido.

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