O Sentido de Família

Às vezes tenho uma certa dificuldade em perceber o que é que significa a palavra família. No sentido etimológico, família advém do latim: "os escravos e servidores que vivem sob o mesmo tecto, as pessoas de uma casa" (http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=fam%C3%ADlia).

No dicionário pode também ler-se o seguinte significado: "Conjunto de todos os parentes de uma pessoa, e, principalmente, dos que moram com ela". 
(http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?al=fam%C3%ADlia).

Ambas as definições continuam em vigor, até a primeira, mesmo nos parecendo estranho. Vamos começar pela definição do dicionário. Designamos, frequentemente e normalmente, a família, como aqueles que vivem connosco  mas também o conjunto de pessoas com as quais temos "laços de sangue" (tios, primos, avós, irmãos, pais). 

No entanto, existem, ainda, famílias que preservam o significado etimológico da palavra: são escravos que vivem no mesmo espaço. Escravos do tempo, Escravos das obrigações, Escravos desses mesmos "laços de sangue". Apesar de serem escravos de algo (na realidade todos nós somos escravos de alguma coisa), dentro deste mesmo conjunto de pessoas que vivem sob o mesmo tecto, há escravos que se tornam senhores e tratam os outros elementos como os seus próprios escravos. No mundo da maior parte das pessoas, podemos transpor esta realidade, como, por exemplo, para o habitual homem que nada faz e tem a mulher e os filhos a trabalhar para si. Volto a repetir: isto acontece. É verdade. E pode estar mesmo ao nosso lado sem nos darmos conta.

Voltando à definição de família como sendo todos os parentes de uma pessoa, à partida podemos pensar que, se estão ligados por graus de parentesco, então têm um sentimento que os une ainda mais: o amor. E têm, também, uma grande qualidade: o respeito mútuo. Penso que este, sim, é o verdadeiro significado de família: um conjunto de pessoas que se respeitam e que se amam. Conheço algumas e isso faz o meu coração descansar, por perceber, que nem tudo é mau. Talvez seja por isso que aqueles que fazem parte dessas famílias, sejam pessoas fortes, com coragem e que deixam uma marca naqueles com os quais têm uma relação ou em quem simplesmente passou por eles. Deixam um exemplo e isso faz com que percebamos que existem boas pessoas.

Creio que a família não se pode definir por meros laços de sangue. Quantos de nós não tivemos já a sensação de que os nossos amigos são como família? Eu já. É o amor e o respeito a resposta para a pergunta: o que é que significa família?. Não é pelo simples facto de os pais criarem os seus filhos, que estes lhes devem obediência e devem aceitar todos os seus erros, todas as suas faltas, todos os seus defeitos, todo o sofrimento e bloqueios que lhes causam. Não é pelo facto de ser da família que devem aceitar faltas de respeito, a repressão e opressão que, depois, continua a fazer parte da pessoa, por mais que ela se tente libertar.

Nunca se deve obedecer só porque é pai ou mãe. Isso não é desculpa nem razão suficiente para baixar a  cabeça e aceitar tudo o que faz. Esse tempo já passou. Porque o respeito não é um posto, nem um dado adquirido pelo grau de parentesco. O respeito merece-se. Tem que se lutar por ele. 

Se tivermos a sorte de estar numa verdadeira família não teremos de lidar com isto. Porque quem respeita e ama verdadeiramente, mais do que a si mesmo e aos seus vícios, não submete ninguém. Muito pelo contrário. Transmite os valores básicos da vida, educa e, depois, deixa-nos viver e aprender, também, connosco próprios. E isto é tão bem conseguido que, quando precisamos de ajuda, temos a humildade de lhes pedir, porque não nos sentimos inibidos por essa necessidade. Porque sabemos que os sentimentos são verdadeiros e genuínos. É, no fundo, uma situação normal.

Tal e qual como os pássaros. Os "pássaros pais" fazem o seu ninho e tomam conta dos seus filhotes. Cuidadosamente, alimentam, abrigam e protegem os mais pequenos dos perigos da natureza. Nunca os perdem de vista. E, quando chega a altura certa, começam a ensiná-los como sobreviver: como se alimentam, como se protegem, aprendem a voar. E, quando a lição está bem assimilada, deixam-nos ir. Os filhos abrem as asas e voam. Voam, para, as suas escolhas e, depois, constituírem a sua própria família e serem eles, desta vez a ensinarem os mais básicos valores da vida.

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