Realidade Utópica

Vivo numa Utopia. Ou, pelo menos, vivia.
Na minha utopia as pessoas ajudam-se umas às outras sem interesses. Dão o seu tempo sem pensar se vão receber algo em troca.

Na minha utopia as pessoas são verdadeiras. Não querem passar por cima de ninguém e mostram aquilo que verdadeiramente são, seja em que altura for.

Na minha utopia, que não está assim tão longe do que acontece, continuam a existir países em guerra, cidades destruídas, tráfico de droga, bairros sociais, pobreza, exclusão social, querelas entre vizinhos, discussões superficiais... Tudo isso existe.

Mas, nesta utopia, aqueles que se declaram como os que querem mudar este cenário declaram-no de forma ponderada, pensada e, mais do que isso, é aquilo que eles realmente querem fazer. Sem servir interesses próprios, sem servir interesses alheios, sem servir os egos de quem os rodeia. Apenas o fazem porque é isso que todos nós devemos fazer: sem pensar no sucesso que teremos, na fama que vamos alcançar, no tempo dos media que vamos ocupar, nem aquilo que essas "acções" podem render.

Na minha utopia, fazemos de tudo para que uma criança possa sorrir. Organizamos espectáculos com e para aqueles que pouco têm, mas que aqui encontram algo para se sentirem úteis.

Na minha utopia, quem tem muito partilha com quem nada tem. De livre vontade, sem estar à espera de receber uma medalha pela sua "boa acção". Isso não é necessário, porque apenas fizeram aquilo que todos devíamos fazer.

Na minha utopia, ficamos com as crianças a cantar até anoitecer. E depois de a noite chegar sentamo-nos para ouvir o que os mais velhos nos têm para dizer. Os seus medos, as suas fúrias, os seus maus gestos, mas também os bons.

Na minha utopia partilhamos.

Agora deixei de acreditar que todas as pessoas que praticam boas acções ou lutam por causas fazem-no só porque sentem que é isso que devem fazer.

Na realidade, muitas delas fazem-no por reconhecimento público;
Para que o público pague o bilhete para ver o espectáculo do artista que apareceu numa festa de beneficiência;
Para que os consumidores paguem para ir àquele supermercado ou àquela loja, que está a vender algo em que só metade do valor desse produto reverte para uma causa social;
Para que os leitores comprem um livro de uma determinada editora para que esta os ofereça a crianças de uma instituição;
Para que o público compre o novo disco do artista que esteve numa festa de uma instituição social.

Na minha utopia, a solidariedade não é um negócio.
Na realidade, principalmente nesta época de presentinhos e presentões, a solidariedade tornar-se numa moeda de troca é o que mais acontece.

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