A Imaginação Interrompida pela Realidade

Caminho sob o sol quente, que me trespassa a pele. Penso que nunca mais chego ao meu destino. Tudo é tão triste e tão cansativo que eu sei que já desisti de ser alguma coisa. Apenas pretendo sobreviver o mais confortavelmente que conseguir. Já não tenho vontade de acelerar o passo, seja para o que for. Nada é assim tão importante que me faça correr - por isso, caminho ao meu ritmo, com a certeza de que vou chegar a horas. Se não chegar qual é o problema?

E, de repente, oiço aquela melodia. Aqueles acordes inconfundíveis... Daquela canção. Abrando o passo e tento concentrar-me para ouvir ainda melhor. Sim, é aquela canção. Tenho a tentação de parar e neste mesmo sítio ficar a ouvir aquela canção. Como eu gosto de saborear aqueles acordes que me fazem recordar de como era bom ser feliz. Finalmente, percebo que a música vem de um café. Aproximo-me e finjo que estou a ler as sugestões no quadro exposto cá fora. Apenas quero ficar ali a ouvir aquela voz. Quando a música termina, volto a fingir que nada quero daquele café e sigo para o meu compromisso.

No caminho até ao meu destino, dentro da minha cabeça sigo a minha viagem à história que criei quando ouvia aquela canção. Sorrio. Sei bem que devo parecer uma louca, mas isso também já não me importa. Ninguém me vai notar. Sempre foi assim e sempre há-de ser. Muito diferente daquilo que estou a imaginar neste momento, é certo.

Como olhas para mim. É quase como se conseguisses ver tudo de mim apenas assim. Eu sei que já
não precisarei de te dizer mais nada. Tu sabes como eu te prezo. Mas, eu também sei, que não vais deixar as coisas ficarem assim. 

Pegas na minha mão e cobres os meus dedos com os teus. Solto um sorriso leve. Consegues sempre fazer-me sorrir. Devagar, ao ritmo da leve brisa que corre em frente ao mar, levas os teus lábios à minha face e, agora, deixo de sorrir. Aquilo que sinto é tão grande que deixo de poder sorrir. É algo que me consome, que me preenche, demasiado esmagador. É algo que não consigo explicar, por isso nada digo. Mas eu sinto.

Fecho os olhos.
Como eu sinto os teus lábios na minha pele. Apenas e só sinto isso. Deixei de sentir a frescura do mar ou o calor abrasador. Apenas te sinto.

Colocas a tua mão na minha outra face. Não é de imediato que abro os olhos. Prefiro, na minha escuridão, continuar a sentir-te. Mas, não por muito tempo. Agora, sinto uma vontade, que não consigo reprimir. Uma vontade em ver-te. De olhar para os teus olhos. Ver em ti aquela intensidade com que sempre me olhas. Afinal, sempre foi assim.

Abro os olhos e aí encontro os teus. O castanho profundo dos teus olhos está impregnado em mim. Quero ficar aqui. Quero que me prendas aqui, neste momento. Neste momento em que apenas vejo amor. Em que apenas vejo como me amas e sempre amarás.

Cheguei ao destino.
Sei bem que não passou de uma canção, no entanto, novamente, tu estás em mim. 

Se me perguntarem com foi o percurso até aqui não sei o que poderei dizer. Não me lembro. Não me lembro como cheguei até aqui. Apenas tenho na minha mente aquela imagem de estarmos a olhar um para o outro. É como se te conseguisse ver agora, comigo. 

Se tu soubesses como te amo. Como te amo o suficiente para desejar que estejas longe de mim. Feliz.

E, na verdade, tu estás mesmo longe. Com alguém do teu lado que nunca te vai deixar sozinho, que te dirá sempre o que mais precisas, em qualquer ocasião, que te poderá abraçar sempre que queiras. Alguém a quem olhes com aquela intensidade... Aquela intensidade que acabei de imaginar. Alguém a quem queiras proteger como se nada mais houvesse de valioso no mundo. Alguém de quem saberás tudo. Alguém com quem construirás o teu futuro. A tua vida. De forma sólida, com histórias e momentos que te farão rir eternamente. Alguém a quem enxugarás as lágrimas. Alguém que te beijará a face molhada. Alguém que te receberá sempre e que tu receberás sempre.

A realidade está aí.

Ela voltou.

Num acto irreflectido olho para o céu. Dou conta, novamente, de como o sol está quente. Está tanto calor, que me sinto a desfazer. Suspiro e tento arranjar um novo propósito para me poder sentir um pouco mais confortável. Se está calor, tenho de encontrar um sítio fresco. Sim. É só dar mais dois ou três passos e estou à porta de onde era suposto chegar. 

Assim faço, como ditam os pressupostos e entro. Agora está mais fresco. Começo a arrefecer e sigo para a rotina onde me sinto enquadrada e onde sei que encontro o meu conforto. Um conforto que não me traz desilusões como a minha imaginação interrompida pela realidade.

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